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"Você sabe o que eu quero dizer, não tá escrito nos outdoors. Por mais que a gente grite, o silêncio é sempre maior" (Engenheiros do Hawaii)

sábado, 26 de junho de 2010

Jornalismo da Maioria

É emblemático, para a construção da imagem do governo cubano como negativo, limitador das liberdades individuais e opressor de direitos humanos como a democracia, que um jornalista faça greve de fome. Logo, desdobram-se argumentos de que o socialismo é ruim para o mundo atual, e, mais ainda, que é autoritário, ditatorial.

O que não se questiona na grande imprensa é se o mundo construído além dessa ilha da América Central é garantia de um quadro oposto a isso. E, principalmente, se é melhor do que a teorização – e práticas – socialistas.

Como acreditar que uma sociedade onde o lucro tem grande importância; a diversidade de raças e sexualidades é veladamente tolhida; a democracia é concedida de uns para outros como um presente, e regida por limites dos países dominantes; como ela pode ser tão melhor para os seres humanos? É progresso? É desejada?

O jornalista, e o jornalismo que o apóia, funda sua atividade, predominantemente, na crença em um progresso. Mas a troco de quê? Da exaltação dos lucros fantásticos, por exemplo, que os royalties do pré-sal trarão a uns poucos brasileiros – que poderão sonhar com os padrões do multibilionário Eike Batista, reverenciado como um grande empreendedor?

Aqueles que saíram às ruas, aos gritos de “O petróleo é nosso!”, talvez sejam os menos beneficiados por essas grandes somas de dinheiro. Serviram mais de fontes para compor a matéria jornalística, e sensibilizar a opinião pública para que se manifeste contra a “desigual” repartição das fatias do bolo. Ou, pelo menos, para que “a voz do povo” legitime as práticas que tenderem a não partilhar o lucro.

É de se esperar que estes mesmos agitadores apareçam nas ruas, clamando pela melhor distribuição de rendas, quando perceberem que as condições de vida não melhoraram, e o petróleo virou ouro de poucos.

A imprensa majoritária, que entende democracia como liberdade ampla e irrestrita de expressão, esquece de dar voz aos que certamente também precisam. É impossível não comunicar, diria o teórico. Mas é possível não repercutir da forma que se espera.

Cuba é um país socialista diante de uma quantidade enorme de capitalismos – plurais, sim, mas todos calcados no triunfo das elites sobre os menos favorecidos. Será que o país não merece uma oportunidade de ter uma imagem mais bem construída? O filósofo Michel Foucault disse que o poder não é uma manifestação somente negativa, pois se assim o for, não se sustenta. Cuba deve ter aspectos positivos na sua forma de governo.

Não que agora devam ser defendidas práticas violentas de repressão, ou se reduzir o mundo à polarização capitalismo-socialismo da época da Guerra Fria. Nem vale dizer que o governo castrista só trouxe o bem para aquela ilha. Mas a impressão que se tira do combate feito a esse país é que há uma necessidade de varrer qualquer sombra dos “derrotados” da face da Terra. Mais ainda: que no resto do mundo repressões como essas não existem, o que é uma omissão grave.

Outros também vivem à margem de uma cobertura jornalística mais apurada. O Movimento dos Sem-Terra, por exemplo, aparece aos olhos da opinião pública como “um bando de baderneiros” que “se valem das brechas da lei para cometer abusos”.

O que é desconsiderado, em boa parte dos casos, é que o movimento não se restringe a ações violentas, irrefletidas. Ele é formado por uma pluralidade de pessoas, e essa é apenas uma de suas faces. Há pessoas lutando por condições mais dignas de vida, por um pedaço de terra, que não se valem de expedientes agressivos, como foi o caso da derrubada de pés de laranja de um latifúndio, recentemente televisionada.

Essas reflexões são apenas um ponto de partida para se analisar o fazer jornalístico. Não se deve naturalizar as opiniões da maioria como se fossem verdades absolutas, a única versão possível dos acontecimentos.

É preciso sacudir os tapetes, revelar os fatos que ocorrem não só por uma perspectiva dominante, mas perceber que há muitos elementos que podem compor uma notícia. Assim, pode-se pensar em uma imprensa que respeite mesmo a diversidade, marca do mundo contemporâneo.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Onde o mundo vai acabar primeiro?


Dia 27 de fevereiro de 2010, cidade de Hilo, Havaí (ou 28 de fevereiro, conforme o fuso horário de lá). Um homem sobe no telhado de sua casa e instala uma câmera que vai filmar um suposto tsunami. Primeiro, uma rede de TV do local – a KHON – retransmitiu as imagens. Logo, a CNN soube, e cuidou de também repassar a novidade. O Planeta – ou pelo menos a América Latina – ainda estava assustado com os efeitos do terremoto no Chile. Dessa vez, pelo menos, a tragédia seria televisionada.

No Twitter, a maior novidade em sites de relacionamento da última semana, milhares de internautas ficaram de olho – e registraram isso em até 140 caracteres. Ainda bem que as previsões estavam erradas, e o tsunami virou marolinha. Mas e quando for pra valer? E quando o mundo todo for dessa (pra melhor?)?

É claro que não se pode debochar do provável término da existência humana – e do planeta. O negócio é quando a imprensa quer entender de futurologia, e avisa sem prevenir a população, para que ele possa se preparar (e há o que fazer no dia do Juízo?).

Mas já dá pra pensar como será a cobertura midiática do fim do mundo. Repórteres de todos os cantos se deslocarão desordenadamente para locais com maior chance de a Terra acabar primeiro. Tudo em nome do furo (?) de reportagem.

O site de buscas Google vai registrar “cerca de” milhões de ocorrências para expressões como “fim do mundo”, “fim dos tempos”, e afins. Autoridades de toda a Terra – e não só da China – vão tentar bloquear estas expressões, e sites de vídeos como o Youtube terão seus vídeos “removidos mediante solicitação”. Nada que os sites de compartilhamento de downloads não resolvam.

Na Família Dinossauros, foi no mínimo deprimente ver os sauros do noticiário de TV se lamentando pela extinção da espécie. Mas nas televisões brasileiras vai ser diferente. Haverá um quê de poesia na crônica de Pedro Bial: “'Mundo, vasto mundo,/Se eu me chamasse Raimundo,/Seria uma rima, não seria uma solução', diria o poeta. Infelizmente, caro Drummond, esse é um problema sem solução”.

José Nêumanne Pinto, indo “Direto ao Assunto (?)”, dirá coisas simples, como “Os desdobramentos da hecatombe reverberam pelos quatro cantos do planeta da Mãe Gaia. Perscrutemos alternativas para evadirmo-nos do final desta odisseia”.

As revistas rivais de sempre, Época e Veja, não se separarão nem no final. “Será mesmo o fim?” é a frase que estampará uma edição especial da primeira – acompanhada do suplemento “10 lições que não aprendemos para evitar o fim do mundo”. A outra, triunfante (mas pra quê?) exibirá um “Nós já sabíamos”, com uma foto impactante de algum desastre natural.

Istoé, alheia a essa discussão (!), trará um lampejo de esperança – ou uma mostra de desconfiança em relação às outras duas – com seus “Novos avanços no plantio de bonsais sintéticos”.

E o Piauí também não deixará de dar seu pitaco; o Meio Norte do dia fatídico anunciará que “Governador assegura: 'Ainda não é o fim'”. O Diário do Povo, pra não ficar por baixo, colocará na primeira página “Prefeito de Teresina tranquiliza população”.

E ainda vai ter gente que, mesmo com tantas oportunidades, não vai saber do que está havendo, nem do que vai acontecer. Não vão se dar conta de que tudo vai acabar. O mal não sabido é inexistente, como já disse Machado de Assis.

Mas ainda é tempo de calma. O mundo não vai acabar assim, instantâneo como um noticiário de tevê – a não ser que os homens façam algo de errado. E a imprensa vai servir para alertar e acalmar a todos. Se não, dá pra recorrer aos agricultores e católicos – e agricultores católicos – que antecipam que todo 18 de março, véspera do dia de São José, vai chover, trazendo sorte pra colheita. Até agora, não erraram.

terça-feira, 1 de junho de 2010

Império em chamas







Sebastian Vettel (à esquerda, inferior) chama Webber de louco após batida (à direita, superior): Louco é quem diz


















A expressão carrancuda de Sebastian Vettel, após o treino de sábado para o GP da Turquia de 2010, denunciava que algo não estava bem em seu fim de semana (errou uma freada que lhe rendeu a terceira posição no grid. Culpou o carro). A performance de seu companheiro de equipe, Mark Webber, irretocável até então, certamente mexeu com a cabeça de Vettel.


Ele, que carrega no histórico de quatro anos e cinquenta corridas de Fórmula 1 uma vitória fantástica em uma equipe média-baixa (a STR), tinha tudo para ser o novo fenômeno da categoria. Talvez pretendesse seguir o caminho de Lewis Hamilton, que, já no primeiro ano, disputou o título mundial e, no segundo ano, levou o campeonato.


Infelizmente, não dispunha do suporte técnico e dos súditos do britânico da McLaren, e teve que tirar leite de pedra dos carros em que andou. Por isso, mereceu grande destaque.


Alguns comentaristas insistem que ele ainda tem muito que aprender. De fato: o erro grosseiro cometido a algumas voltas do fim do Grande Prêmio em Istambul Park não pode ser cometido por quem pretende disputar a temporada de F-1. Ainda mais do jeito que a tabela de classificação anda instável.


Webber se manteve na ponta com 93 pontos, mas se vê ameaçado pelos rivais Jenson Button (88) e Lewis Hamilton (84), o vencedor da corrida. Vettel, antes vice-líder, amarga a quinta posição (78 pontos) como consequência de sua manobra infantil.


As imagens são claras em mostrar que o erro de Webber foi se manter no seu traçado. Sebastian Vettel não quis simplesmente forçar uma ultrapassagem; queria que Webber o deixasse passar, pois o alemão atirou o carro na curva na tentativa de obrigar o companheiro de equipe a reduzir. Má ideia.


O australiano apenas se defendeu, pois o carro de Vettel não estava 100% à frente do seu. Praticamente ileso (fora a avaria no bico, que o obrigou a mais um pit-stop), ainda teve a chance de voltar à corrida e terminar em terceiro. Sebastian não pôde experimentar a mesma sorte: seu RBR ficou bastante avariado, e ele abandonou a prova com gestos de “louco” para Mark Webber. Loucura de quem? Ele já não é mais tão novato na categoria; erro censurável.


Aprendesse com Lewis Hamilton (e logo ele, tido como louco-mor da atual F1) e Jenson Button: voltas após o incidente, os dois travaram uma disputa limpa e emocionante pela primeira posição. Button deu sinais de que iria segurar a ponta depois de excelente manobra. Mas Lewis não se entregou tão fácil assim, e recuperou o lugar que herdou de Webber.


Que o campeonato está embolado já não é mais nenhuma novidade; que Webber perdeu uma grande oportunidade de fazer mais um bom resultado no início do ano que, a exemplo de Button em 2009, pode lhe render o título de 2010, incontestável. A RBR sofreu um leve arranhão na hegemonia da atual temporada. Infelizmente, causado por fogo amigo.


Se esse incidente desembocar em uma crise – como as trocas de acusações entre os dois pilotos anunciam - poderemos assistir à ruína do império, exatamente como ocorreu em 2007, na disputa interna de Hamilton e Fernando Alonso na McLaren. Pilotos excelentes, mas que, pelo desequilíbrio de um, afetaram toda uma escuderia. Na equipe chefiada por Christian Horner, porém, nem vai ser preciso uma denúncia de espionagem no meio do caminho.